FORMAÇÃO VOCACIONAL

Revista Voz Amiga | Volume 32 | Nº 1 | Ano 2022

 


 

O ponto de partida

Arquivo Pessoal Congregação de Jesus Sacerdote – Padre Pio Milpacher, CJS.

Todos concordamos em afirmar que a vocação é um dom de Deus e que Ele o dá a quem quiser e, frequentemente, por caminhos misteriosos e imprevisíveis.

Mas, pela Encarnação, Deus manifestou a vontade de implantar o seu Reino entre os homens, seguindo o caminho das leis de natureza humana por Ele mesmo criada. Então, enquanto continuamos na oração e reavivamos a confiança na Providência divina, estudamos os caminhos humanos que favoreçam a acolhida e o desabrochar dos dons de Deus.

Pela natureza com que Deus formou os seres humanos, brotam nas crianças, e amadurecem nos adolescentes aspirações a tipos de vida, admirados a um grande ideal. Uma criança pode ficar fascinada pela vista de um soldado fardado, um médico no exercício da profissão, um atleta num estádio, um sacerdote no exercício do ministério… Daí surge o sonho de ser um dia como ele. O adolescente olha os grandes com maior realismo, procurando modelos: pessoas que lhes parecem realizadas, cumprindo uma tarefa importante e útil, que lhes proporciona, respeito e satisfação.

Se Deus nos criou assim, nas novas gerações surgirão aspirantes ao sacerdócio, se eles tiverem modo de encontrar sacerdotes bem-sucedidos, cativantes, modelos de êxito existencial e de vida que merece ser vivida.

Arquivo Pessoal Congregação de Jesus Sacerdote – Padre Pio Milpacher, CJS.

As orações, as explicações, os dias vocacionais de estudo e de retiro, terão efeito, se os jovens conseguirem projetar o que ouvem numa pessoa concreta de um padre. Os agentes de pastoral vocacional, leigos, irmãs, catequistas, poderão despertar, explicar, ajudar na concretização do projeto. Mas, se o padre ou os padres conhecidos pelos adolescentes não forem cativantes, será preciso um milagre. (que sempre pode acontecer, mas que não está na linha do plano normal da Providência) para que amadureça uma decisão para o sacerdócio.

Daqui uma primeira conclusão: o sacerdote é o agente primeiro e insubstituível da pastoral vocacional.

Digo um sacerdote cativante. Não digo autêntico, zeloso, virtuoso. Isso se pressupõe. Os jovens observam atentamente se a vida do sacerdote corresponde às palavras, são até implacáveis na exigência de autenticidade. Mas não basta, se o padre tiver uma virtude bitolada, fechada, amarga, faltará aquele “fluído” psicológico, que provoca simpatia, e, com isso o despertar vocacional.

O ambiente vocacional

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Para facilitar o florescimento de vocações sacerdotais é preciso também estudar a formação de um ambiente favorável, criando grupos de crianças, adolescentes, jovens sensíveis aos problemas religiosos do povo. O Documento n. 20 da CNBB diz expressamente: “A pastoral das vocações sacerdotais é um aspecto de esforço mais amplo da pastoral orgânica, que visa tornar as comunidades cristãs corresponsáveis e dotadas da variedade de ministérios que expressam as multiformes facetas da missão da igreja e a riqueza dos dons do espírito.” (n.239)

Antes, no n. 40, o documento tinha declarado: “A Igreja deve estar inteiramente voltada para o serviço: deve  ser toda ministerial . . . Todos na igreja são chamados a assumir um serviço, um ministério. Todos os cristãos são chamados a participar ativamente da missão da Igreja.”

Arquivo Pessoal Congregação de Jesus Sacerdote – Padre Pio Milpacher, CJS.

Quando numa paróquia há um convite constante aos leigos para assumirem tarefas de todo tipo (serviço litúrgico. de catequese, aos pobres, aos doentes); quando muitos adultos e sobretudo jovens são incentivados para avizinhar colegas afastados, ir em busca, de casa em casa, das crianças que não frequentam a catequese, convidar a participar dos grupos de oração e retiros espirituais, a dar palestras e testemunhos, a organizar encontros, eles começam a experimentar como este trabalho é válido, conseguem reconduzir a Cristo pessoas desorientadas, afastar de vícios outros que pareciam perdidos.

Então, eles começam a sentir o problema religioso como envolvente a própria pessoa, entendem que o apostolado é possível, benéfico e gratificante. Assim, brota desejo de progredir mais e mais, doar-se mais, capacitar-se mais, a decisão para uma vocação de dedicação total aparece como um passo a mais. São admirados com os que têm coragem de dá-lo e surge espontâneo o questionamento: “por que não eu?”.

Resumindo: um pastor zeloso forma uma comunidade atuante; a comunidade atuante abre caminho às vocações de doação total.

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Claro que, onde não há pastoral das crianças, não há grupos de adolescentes e de jovens comprometidos, não há terreno para vocações. Crianças preparadas a primeira comunhão com a preocupação prevalente das fotografias e da festa, não pensam numa vida de amizade total com Jesus. Adolescentes que chegaram à crisma preocupados sobretudo de ganhar um bom padrinho e dizer: “Agora fiz tudo” não pensam em se engajar para o Reino de Deus. Não basta repetir durante a preparação que “a Crisma é o sacramento do engajamento cristão”. Eles devem sentir-se como mergulhados num ambiente de jovens comprometidos, devem ver os colegas mais velhos se tornarem catequistas, organizar liturgias, visitar os pobres, dar testemunho nos encontros . Só daí surge o desejo; “eu também quero”.

Mas o exemplo do engajamento deve ser para uma pastoral autêntica. Grupos de Jovens voltados somente para organizar festinhas, passeios e manifestações sociais, não dão vocações. As vocações surgem nos grupos orientados fortemente à oração e a pastoral: para a conversão a Deus, com a volta à participação da vida cristã, livres de vícios, com aprofundamento bíblico-catequético, compromisso para uma justiça, honestidade e caridade. Um viveiro de vocações foram sempre os grupos de coroinhas, se bem formados e acompanhados.

O discernimento e acompanhamento vocacional.

Arquivo Pessoal Congregação de Jesus Sacerdote.

Foi observado que enquanto um jovem fica “pensando” em ser padre, ele não vai para frente. Pode até perder anos preciosos e acabar desistindo. O movimento rumo a realização começa no dia em que o vocacionado se abre com uma pessoa capacitada, geralmente um padre, e começa um estudo do problema pessoal, com acompanhamento metódico. Muitos jovens perdem a vocação porque não tem coragem de falar, ou não encontram pessoas indicadas para ajudá-los no esclarecimento. Alguns esperam de falar até que alcancem a certeza de ter vocação; e dado que essa certeza é muito difícil de ser alcançada sozinhos, acabam desistindo. É preciso criar um convencimento nos jovens que, começar um diálogo vocacional não significa decidir-se de entrar no seminário. Significa simplesmente começar a examinar se há um chamado de Deus, se existem os dons Necessários para a missão.

Deveria haver pelo menos um ano de acompanhamento vocacional na própria comunidade, antes de entrar no seminário. Este tempo é extraordinariamente importante. Em primeiro lugar, esclarece as ideias sobre a vida e a missão do padre, a diferença entre o padre diocesano e o religioso, a situação de Igreja de hoje, as motivações pelas quais alguém pode desejar o sacerdócio, as condições e as qualidades necessárias para atingir a meta, os passos a serem dados.

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O candidato comprometido em algum grupo pastoral de sua paróquia, tem modo de testar si mesmo, experimentar algumas dificuldades e gostar de recolher algum fruto. Se decidir de entrar no seminário, entrará bem decidido e sabendo onde pisa e aonde quer chegar. Isso se, naturalmente, o acompanhamento for bom, o candidato se abrir totalmente e o acompanhante assumir de verdade sua tarefa. o que lamentavelmente não acontece frequentemente. Porque muitos acompanhamentos se reduzem a alguns encontros esporádicos e superficiais. 

Outros reduzem ao mínimo esse tempo, por medo de que outros peguem o aspirante e o desviem para a própria diocese ou instituto. Então, o assim chamado acompanhamento, se reduz a um par de encontros para conhecer superficialmente a aspiração do candidato e combinar uma apressada entrada no seminário. Não compreendem como os meses de acompanhamento, antes de deixar a família, podem ser mais marcantes e decisivos do que anos de seminário.

Porque agora se está fazendo um trabalho individual, livres de condicionamentos. Amanhã, no seminário, talvez se encontre como um número na massa. Agora ele é livre do seu tempo; ele o organiza: oração que faz, o estudo, o apostolado, são frutos da sua criatividade e, portanto, marcantes a pessoa. Amanhã tudo será ditado por um horário e talvez se tornem rotina.

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O bom acompanhamento descobre também as vocações inautênticas, que não faltam! Aliás, parece que a porcentagem delas aumenta. Trata-se de jovens que querem ser padres por admirarem aspectos aparentes da vida deles: por estarem em evidência nas funções litúrgicas, encontrar oportunidade de falar em  público, presidir uma paróquia, ter uma acomodação garantida. Querem servir-se da Igreja, não servir a Deus e ao próximo. Alguns tem até tendências sexuais invertidas e pensam encontrar um refúgio no sacerdócio. Desaconselhados insistem para serem admitidos no seminário; mandados embora de um, procuram um outro; por onde passam estragam o ambiente e a moral, e, se conseguem chegar ao sacerdócio , tornam-se uma lástima  para a Igreja.

 

Um bom acompanhamento inicial, abre os olhos a estes jovens, ajudando-os a abandonar de vez o pensamento da vida sacerdotal. Um diálogo sério, começado quando ainda o mal está a fase inicial, pode endireitá-los, poupando a si e aos outros, muitos sofrimentos.

Uma vez que o candidato entrou no seminário, o serviço do acompanhante não acabou. ele fica sempre amigo, e amigo da primeira hora. As visitas mútuas (do padre do seminário e do seminarista na paróquia) reforçam a amizade, proporcionam apoio, permitem partilhar alegrias e dores. igualmente o contato com a comunidade paroquial ajuda o crescimento mútuo: o seminarista dá seu testemunho e trabalho pastoral; a comunidade reza e apoia; cresce a dimensão ministerial da igreja local.

 

 

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Por Padre Pio Milpacher, CJS. 

Congregação de Jesus Sacerdote

 

 

Fonte: Revista Voz Amiga